Sou esquerdalho (é assim que nos chamam, não é?), piscando o olho ao socialismo libertário. Para mim, ser de esquerda (e admito que quem não o seja também possa pensar assim, porque não compactuo com paternalismos nem com supostas superioridades morais) é querer o bem comum, acima de tudo o resto. E liberdade, no grau mais próximo de liberdade que possa existir. Sem fiscais morais, sem autoritarismos de algibeira, sem estado social de consciência pesada, sem ditaduras pelos impostos.
Se eu tenho ou sou, não poderá haver nenhuma razão para os outros não poderem ter ou não poderem ser, desde que possam ou queiram. Nunca fui invejoso.
Preocupo-me com os outros e com a dignidade da(s) vida(s). Não sei se, axiologicamente, isso será um valor universal.
O voto foi uma conquista, mas só é um valor em si próprio quando a conclusão que vem com o mesmo se afigura um acrescento. Acho que é uma desinteligência muito recorrente achar-se que um determinado fim vale por si só (assim como confundir direito com dever).
É muito diferente não poder votar, de maneira nenhuma, e poder escolher entre votar ou não. E não, não é o mesmo, nem é sequer justo que amarremos as pessoas a frases como aquelas que se vêem e lêem por aí ("muitos tiveram de lutar para que tivesses esse direito", etc). Quem quiser, que pegue nelas e as envergue ao peito. Votar só por votar, não.
Os números da abstenção demonstram o afastamento, cada vez maior, das pessoas em relação ao fenómeno político. E desenganem-se aqueles que pensam que condeno a classe política por ser, apenas, classe política. Os políticos não nascem de geração espontânea: são um reflexo da nossa sociedade.
Não podemos esperar que uma sociedade assente em "competitividade", a deusa/vaca sagrada da modernidade, "ratings", "pigs" e demais termos depreciativos, elaborando rankings entre pessoas, que acredita em cidadãos de 1ª, de 2ª e de 3ª, que promove a estupidez, a desigualdade social, o egoísmo e o apontar de dedo, cuja noção de "mérito" é truncada e decidida à priori, produza, em grande quantidade, políticos (e quaisquer outros mesteres) conscienciosos. Se os há? É claro que sim, mas poucos. Os outros, os que aceitam apenas o papel de "outros", são triturados pela máquina (que vai, mais cedo ou mais tarde, esgotar todos os recursos que existem, porque não há crescimento para sempre).
Ninguém tem de ser forçado a jogar este jogo. Eu voto, votei e votarei por convicção, mas poupem-me a essa moralidade de pechisbeque. E escutar fulanos, a quem eu pago o salário, proferirem cavalgaduras do tipo "sanções para quem se abstém", é o fim da picada.
Com que direito? Essas pessoas não pagam impostos, por acaso? Já agora, enviem-nas para um guetto, ou coloquem-nas na lista negra do Banco de Portugal.
Enquanto o voto em branco não tiver expressão palpável, é o que me ocorre escrever. E já foi muito.
Preferirei um mundo no qual a consciência, a ética e a moral pesem sempre mais do que qualquer legitimação.
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