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Foto do escritorPaulo César Gonçalves

JOANA EMÍDIO MARQUES: O TIMING CERTO (OU O MAIS ACERTADO)


Ninguém, creio, pode ser julgado por demorar mais ou menos a perceber a altura para falar, ou tornar público algo que se manteve, muito ou pouco tempo, em segredo. Como em quase tudo na vida, não há fórmulas certas, nem remédios infalíveis. Os timings são as pessoas, e, como escrevia Anais Nin, "não vemos as pessoas como elas são, mas como nós somos".


Uma espécie de #metoo tardou, mas fez o caminho até Portugal. Raposo, o força-polémicas, como que a querer poder legitimar uma causa que, sem concessões, é justa por si, pediu nomes. Estava, bem ou mal, criado, o timing. Alguém, corajosamente, se chegou à frente. E o que vimos acontecer? Um enxovalho, com honrosas excepções em sentido oposto, à vítima.


Não chamo ao que temos em Portugal um "meio literário". É antes o "clube dos amigos que podem editar em determinadas condições", ou "a malta que se senta à mesa e é muito intelectual": a rodinha de privilégio, cerceada à moda da matilha que faz xixi para delimitar território. Pois bem, a matilha saiu em procissão, de estandarte na boca, como o Decepado, a defender o aparente agressor. A mão que dá (e que pode tirar).


Há dias, em conversa com um amigo, extraordinário argumentista, ele chamou-me a atenção para o paralelismo que havia entre esta situação, denunciada por Joana Emídio Marques, e a tragédia do Meco, em 2013. Muitos se indignaram, muitos apontaram o dedo, muitos escarneceram. Demasiada gente sabia o que se passava, ano após ano, com as famigeradas praxes académicas, algumas das quais terminadas em morte, mas com um rasto de destruição anímica e psicológica a vários níveis. "O Público", em 2014, abriu a discussão e aceitou testemunhos. Choveram desabafos, casos de vidas em suspenso e relatos verdadeiramente desumanos. Não me recordo de ter lido, ou escutado, em lado algum, que toda aquela gente vinha fora de tempo. E não vinha. Ninguém quis, antes do Meco, ouvir os avisos, os alertas, os gritos. Estava criado o timing.


Agora não é diferente.


Por que razão avanço com este tipo de comparação? Porque, tal como aquelas dezenas de pessoas, também eu guardei o meu testemunho durante muitos anos. Não o torna menos credível, nem fora de tempo. Soltei-o quando achei que poderia ser ouvido ou lido com outra atenção. E abrir essa caixa de pandora nunca se faz de ânimo leve. Nunca. A mim, por exemplo, valeu-me uma depressão.


Por isso, Joana, agora escrevo directamente para si: valha o que valer, tem o meu apoio. No timing certo (ou no mais acertado).



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